sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Caça ao Demônio

Nos bosques de Nova Jersey, lenda inspira uma caçada
Dan Barry

O final do verão não é a melhor das épocas para a caça ao demônio. De uma parte, a criatura tende a se revelar com maior freqüência no inverno, quando a bastante sufocante floresta Pine Barrens, no sul de Nova Jersey, traz uma sensação extra de terror. De outra, os carrapatos são a morte nessa época do ano.
Uns poucos caçadores dedicados reúnem-se no JD's Pub, em uma rua de comércio perto do epicentro do fenômeno chamado de "Demônio de Jersey". Nas paredes ao redor estão penduradas velhas ilustrações daquilo que eles buscam: pés de bode, uma face que se parece com um cavalo, uma envergadura de asas talvez ampla demais para percorrer os corredores do supermercado Super Foodtown que fica a algumas portas dali.
Essas pessoas com instrução universitária, que chamam a si mesmas de "Caçadores do Demônio", pedem uma rodada de refrigerantes que inclui dois Shirley Temples (uma bebida com groselha). Dizem que são "pesquisadores oficiais" do Demônio de Jersey, um tímido espécime de criptozoologia que assombra estas bandas há tanto tempo que em épocas antigas chegou a despertar a o medo e a fúria dos colonos e seus típicos chapéus de três pontas.
Laura Leuter, de 30 anos, a presidente do grupo, já sabe o que você está pensando: por que esses "caçadores de demônios" não acordam, vão até aquele Super Foodtown e compram algum café para cheirar?
"Sou a primeira a dizer, 'Sim, eu procuro o Demônio de Jersey, há-há'", diz Leuter, que supervisiona um call center quando não está em busca de rastros do demônio. "Mas por que, até hoje, as pessoas ainda dão relatos de que o avistaram?"
Aqui cabe outra pergunta: por que nós ansiamos por tais coisas?
Por que nós damos apoio à descoberta de seres que subverteriam nossa compreensão da ordem natural? Por que, por que será, que um grupo de pessoas realmente espera que em algum lugar da escura vastidão, além das luzes fluorescentes da rua de comércio de Nova Jersey, haja um demônio fazendo suas travessuras?
Esse curioso desejo ficou em grande evidência recentemente, quando dois homens anunciaram sua descoberta de uma carcaça metade macaco metade homem em área remota da Geórgia: um Pé Grande falecido. Eles colocaram os restos em um freezer e prometeram que a análise do DNA iria provar conclusivamente a existência da legendária criatura.
Que a suposta carcaça do Pé Grande viesse a se mostrar uma descongelada roupa de borracha recheada com entranhas de animais é menos instrutivo que a forma pela qual os tablóides dados de graça em lojas registraram o tema - primeiro com uma espécie de ceticismo esperançoso, depois, assim que a fraude foi exposta, com um desdenhoso, nós-sempre-soubemos-disso, tá?
"Embustes," comenta uma entediada Leuter. "Um completo desperdício de tempo para todo mundo."
Nesse sentido, os caçadores de demônio bebedores de refrigerante que se sentam por aqui, discutindo seu hobby da mesma forma como outros possam discutir um interesse comum em miniaturas de trens ou coleções de bonecas Cabbage Patch, fazem uma busca em nosso benefício. Eles exploram aquela sombria lacuna que existe entre o fato e a lenda, agindo em relação a algo no qual alguns de nós jamais pensamos: existe algo lá fora.
O belo e misterioso Pine Barrens pode incentivar tais pensamentos. É uma área muito pouco desenvolvida, com pinheiros e carvalhos, pântanos e alagados, cobrindo mais de um milhão de acres no extremo do estado mais densamente povoado do país. Produziu dezenas e dezenas de lendas e histórias, embora nenhuma delas tão famosa quanto a do Demônio de Jersey.
A versão comum, que data de 1735, refere-se a uma mulher local chamada Mãe Leeds. Casada com um bêbado ingrato e grávida de seu 13º filho, ela teve o que hoje em dia seria chamado de "um momento". Ela manifestou temor pelas crianças e o desejo de que seu bebê não nascido fosse um demônio.
Você nunca quis fazer desaparecer alguma frase que você tenha dito?
Em vez de saudar o mundo com um som afetuoso, continua a história, o recém-nascido transformou-se em um demônio com uma cauda em forma de serpente e apresentou-se aos membros da família devorando alguns deles. Depois, subiu pela chaminé e foi para o ambiente selvagem de Jersey para iniciar séculos de gritos estridentes, emboscadas e ocasionais agressões.
Talvez o nascimento de uma criança deformada tenha levado à criação da história; talvez alguns pais tenham adaptado a história para manter as crianças afastadas da mata ao redor. Seja qual for sua origem, o local do demônio em questão foi estabelecido em janeiro de 1909, quando estranhas pegadas, ataques a animais de criação e relatos de encontros com o demônio durante vários dias criaram pânico em certas partes de Nova Jersey e da Pensilvânia.
Grupos policiais temporários realizaram buscas, oficiais da polícia dispararam suas armas e escolares e operários encontraram motivos para não sair de casa.
Ocasionais observações desde então garantiram lenha para a fogueira da lenda. E apesar da denominação demoníaca dada a uma equipe de hockey profissional, do entusiasmo de programas de televisão desesperados por cenas para matérias sobre Halloween e de um filme que foi assustador por todos os motivos errados - "13th Child: Legend of the Jersey Devil" ("13º Filho: a Lenda do Demônio de Jersey"), com Cliff Robertson (!), Lesley-Anne Down (!!) e Robert Guilaume (!!!) - a criatura continua sendo bastante real para algumas pessoas, a ponto de justificar a perseguição.
Leuter, de sua parte, ficou tão assustada com as histórias sobre o Demônio de Jersey quando era criança que decidiu superar o medo lendo tudo o que podia a respeito da criatura. Há vários anos, ela ajudou a criar os Caçadores de Demônios, um grupo que hoje tem uma dezena de membros em atividade, um site bastante ativo (www.njdevilhunters.com) e um processo de adesão de certa forma rigoroso.
Os candidatos a membros preenchem um questionário e são entrevistados no JD's Pub, onde eles são julgados pelo seu conhecimento a respeito do demônio, pela sua capacidade de fazer amigos e provável confiabilidade durante investidas noturnas pelas matas e pântanos. Todos que manifestam o desejo de matar o Demônio de Jersey são rejeitados.
Os caçadores passam parte de seu tempo investigando relatos de pessoas que dizem ter visto o demônio ao site na internet. Fazem entrevistas, visitas aos locais, o costumeiro método clássico. Embora tentem não parecer céticos demais, por temor de desencorajar os relatos honestos, eles sabem no mesmo instante quando um relatório se desvia demais dos hábitos conhecidos da criatura.
"O demônio em um agitado cruzamento na Filadélfia, saindo de um táxi?" diz Leuter. "De forma alguma."
O restante do tempo eles passam visitando habitats tradicionais de demônios: a deserta e histórica Batsto Village, talvez, ou os escombros do que se diz ter sido a casa de Mãe Leeds. Até agora, encontraram pouco mais que assustadores ruídos, mas eles aderiram ao credo endossado por todos os que procuravam o Pé Grande, o Monstro do Lago Ness e o fantasma de Grande César.
Como escreveu Leuter: "até que alguém prove que não há nada por aí, continuarei acreditando que existe, e também vou continuar com meus esforços para descobrir provas de que o Demônio de Jersey de fato existe. É isso."
O grupo costuma receber telefonemas, incluindo vários de pessoas que querem reportar algo visto há várias décadas. Uma mulher chamada Gretchen, por exemplo, contou ter visto uma criatura com aparência de demônio quando se dirigia com sua família pelo Pine Barrens em 1966. Era do tamanho de um homem, ela disse, com pequenos chifres, um longo rabo e asas que "não tinham aparência de asas de morcego, mas também não eram grandes asas felpudas como as de anjos".
Só neste ano, houve pelo menos dez prováveis aparições, incluindo uma criatura semelhante a um cavalo que voou sobre Jackson e um animal de asas, com grito estridente que ficou pendurado em um galinheiro em Eldora. Não faz muito tempo, uma mulher relatou ter visto "uma criatura muito grande, com olhos vermelho-alaranjados" voando sobre as árvores ao longo do Garden State Parkway em Seaville.
Tão vívido. Tão real. Com tanta vontade de que fosse verdade.

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